segunda-feira

As oportunidades de trabalho ficam reduzidas após a gravidez?

Uma pesquisa britânica revelou que 60% das mulheres acham que a carreira declina após o nascimento dos filhos. Você faz parte dessa estatística? Veja o que mães que passaram por isso e especialistas em carreira falam sobre o assunto


A administradora de empresas Letícia Ferrino não se espantou quando sua colega de trabalho, grávida, ouviu da gestora a seguinte frase: “Que pena que não dá mais tempo de abortar!” Na época, ela era uma das poucas mulheres que trabalhava numa grande empresa tabagista de Porto Alegre e nem sonhava em ter filhos. “Naquele ambiente, era normal ver a gravidez como algo negativo. Eu pensava que era um desfalque na equipe, uma sacanagem. A sensação era de que a mulher fazia de propósito”, explica.

Anos depois, Letícia mudou de cidade, de emprego e engravidou. Foi tudo de repente. Bem no período de experiência! Por ironia do destino, a atual empresa não se importou com a situação. Pelo contrário. Deu assistência em tudo o que ela precisou. “Souberam respeitar os meus limites. Quando eu não podia mais dirigir, colocaram-me para trabalhar no escritório e nunca me desvalorizaram”, conta. Depois da licença-maternidade, quis pedir demissão para cuidar do filho Davi, hoje com 8 meses. “Meu constrangimento foi embora quando meu chefe disse que entendia, pois sua mulher havia passado pela mesma situação e tomado uma decisão parecida”, diz.

A mesma sorte teve a analista de vendas Fernanda Paula Biancardini, que contou com a compreensão dos profissionais da empresa em que está há onze anos ao longo das gestações de Gustavo, 4 anos, Pablo, 2 meses, e Henrique, 45 dias. Em todas, ela tirou seis meses de licença-maternidade e mais vinte dias de férias. Porém, não escapou de ouvir do próprio primo, gerente da construtora, que, se ele fosse o chefe, ela seria demitida no retorno. “Como muitos, ele traz a ideia de que a mulher só se compromete com a rotina e os imprevistos dos filhos. Ou mesmo que elas perdem a ambição profissional depois da maternidade”, relata.

Essas histórias mostram os dois lados pelos quais a mulher pode pender dentro da empresa quando engravida. Embora haja compreensão e cuidado em alguns ambientes de trabalho, em outros, a falta de tato com a gestante beira o absurdo. E não é só no Brasil, como revela uma pesquisa feita pelo escritório de advocacia com sede em Londres Slater & Gordon, que anualmente representa centenas de mulheres na Europa que sofrem com discriminação no trabalho. O questionário, respondido por mais de 2 mil delas, revelou que seis em cada 10 afirmam que gravidez significa declínio ou estagnação na carreira. Entre os motivos mais citados estão oportunidades reduzidas (27%), falta de espaço para ocupar posições de gerência (18%) e crença de que a mulher fica ultrapassada depois da licença-maternidade (27%). Para 8% delas, o sentimento é de rebaixamento.

Para Cristiane Vaz Pertusi, coaching e psicóloga especialista em Desenvolvimento Humano, a falta de comunicação entre a empresa e a gestante está na origem de muitos problemas que geram percepções unilaterais e até distorcidas. “A empresa cria expectativas sobre a postura e o desempenho da profissional grávida. Por outro lado, a mulher fica mais reservada por causa do momento especial que está vivendo. Ela começa a ter uma energia física e emocional diferente. Algumas mulheres também sentem certa culpa por engravidar e ficam mais temerosas e recolhidas mesmo dentro do ambiente de trabalho.”

Há outro motivo que torna a situação um pouco mais complexa: a dinâmica atual do mercado de trabalho. As empresas estão operando em sua capacidade máxima, com cada vez menos pessoas, o que faz com que um profissional exerça muitas funções ou desempenhe vários papéis. Por isso, dependendo da função que a mulher tem ali dentro, a empresa não consegue ficar muito tempo sem colocar outra pessoa no lugar, como conta Elaine Saad, vice-presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH): “Quando essa mulher retorna, o substituto já está completamente adaptado e aí o problema é fazer a readaptação dessa mulher”.

Existe solução?
Sim, apesar de não ser tão simples assim. Mas pode começar com um diálogo maior entre a mulher e a empresa. Elaine recomenda um planejamento da grávida em conjunto com a companhia para encontrar maneiras de minimizar a ausência da funcionária durante a licença-maternidade e, depois, o impacto do retorno. É importante também que a mulher deixe claro seus projetos e suas ambições futuras. Para Cristiane, a empresa pode se valer de programas de atenção ao desempenho da grávida, o que daria mais apoio na comunicação entre gestores e funcionários. “A maternidade traz inseguranças, faz com que a mulher se sinta mais indecisa e sobrecarregada”, diz. “Quanto mais a empresa entender esse momento, dar apoio e incentivo, mais tranquila a mulher fica para continuar sua carreira.”


Letícia concorda e a mudança de seu pensamento trazida pela maternidade trouxe ainda uma reflexão sobre a situação da mulher: “A gente se doa tantos anos, trabalhamos além do horário legal de trabalho e, às vezes, até de fim de semana. É justo que a mulher tenha, no momento em que mais precisa, o suporte da empresa para que ela possa se voltar mais à criança. Afinal, criar um filho com tranquilidade é bom para o país, para o mundo e para todas as pessoas”. Isso sem contar que, em geral, as mulheres se tornam melhores profissionais depois da maternidade. Uma pesquisa global feita com 26 mil executivos revelou que aquelas que têm filhos são vistas como mais criativas e produtivas. Você concorda?

Fonte: revista Crescer

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