Pesquisadores reuniram participantes de um estudo realizado há mais de 30 anos e constatam que aqueles que resistiram melhor às tentações quando crianças, hoje, são mais magros. Confira dicas para estimular seus filhos a controlar seus impulsos
Nádia Mariano
Comer só uma bolacha, não a metade do pacote. Essa é uma missão difícil para muitas crianças. Mas ao contrário do que se pode imaginar, a culpa não é delas, é da natureza. Como você bem sabe, nós cedemos facilmente a impulsos. Nos primeiros anos de vida, então, é quase impossível resistir. Mas as crianças que conseguem controlar esse instinto têm mais chances de tornarem-se adultos mais saudáveis. Essa é a conclusão de um estudo realizado pela Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos, que foi publicado este mês no The Journal of Pediatrics.
Os pesquisadores reuniram um grupo, que entre os anos de 1968 e 1974, participaram de uma grande pesquisa na Universidade Columbia. Na época, os participantes tinham, em média, 4 anos e foram submetidos a um teste de impulso alimentar. Após serem colocadas em uma sala, as crianças receberam um marshmallow - doce popular nos Estados Unidos - e a seguinte instrução: poderiam comer a guloseima a qualquer momento. Mas se conseguissem esperar por 15 minutos ganhariam mais um doce.
Cerca de um quarto dos participantes do primeiro estudo voltaram a ser analisados agora, cerca de 30 anos mais tarde. Os pesquisadores atuais mediram seus índices de massa corpórea (IMC) e concluíram que cada minuto a mais de espera durante a infância resultou em – média – 0,2 pontos a menos no IMC. Ou seja, as crianças que esperaram mais, hoje, são adultos mais magros.
“O autocontrole interfere em todos os campos da vida, não só nos hábitos alimentares, aquelas crianças que aprendem desde cedo a esperar, possivelmente se tornarão adultos mais equilibrados, menos impulsivos“, diz Cássia Roberta da Cunha Thomaz, especialista em análise do comportamento infanto-juvenil e professora da Faculdade de Psicologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Com isso, os pesquisadores apontam o autocontrole como um importante combatente da obesidade, problema cada vez mais presente na sociedade contemporânea. “Estimular as crianças a controlar o impulso, o desejo de comer é importante, mas é fundamental oferecer a elas alimentos saudáveis”, diz Gabriela Kremer, endocrinologista pediátrica do Hospital Pequeno Príncipe. “É uma questão de formação de paladar, quanto mais tarde o açúcar for introduzido na alimentação das crianças melhor, porque aí ela vai se habituar a consumir alimentos mais saudáveis”, completa.
Dá para ensinar?
Os especialistas concordam que é possível, sim, orientar a criança desde cedo para que ela aprenda a ter autocontrole. A dica básica é ter em mente que o aprendizado tem dois lados, dos pais e da criança, e que uma boa conversa é essencial sempre. Adultos pacientes e equilibrados tendem a ser mais bem-sucedidos ao ajudar o filho a lidar com frustrações e limites. Veja a seguir outros exemplos de como praticar tudo isso na sua família.
Crianças pequenas
Desde bebê, seu filho consegue compreender que nem tudo é possível o tempo todo. Só que, até os três anos, a linguagem não verbal é a mais importante. A criança vai entender os argumentos do adulto pelo tom de voz e pela postura.
Dica: esteja tranquilo e trate o assunto com a devida importância. Uma explicação dada de maneira distraída dificilmente será acatada pela criança.
Na hora das compras
Você não precisa atender todos os pedidos do seu filho. O indicado é criar regras: se o filho deseja um celular novo, os pais podem combinar com ele que a troca ocorrerá uma vez por ano ou no próximo aniversário, por exemplo.
Dica: uma ideia é dar o dinheiro exato para o filho usar num passeio. Assim, ele precisará fazer escolhas sensatas para fazer a verba render. Ou, então, ao entregar a mesada, converse com o filho para ajudá-lo a planejar os gastos: se ele não comprar vários chocolates ao longo da semana, terá dinheiro para ir ao cinema com os amigos no sábado.
Com os amigos
Explique sempre para a criança que seus atos e decisões sempre têm alguma conseqüência, adequando o tom e as explicações para a idade.
Dica: diga ao seu filho que, se explodir com o amigo num jogo de futebol, ele certamente ficará magoado. Se desistir pintar todo o desenho porque está difícil, a obra não vai ficar tão bonita.
Fontes: Guilherme Polanczky, psiquiatra da infância e da adolescência e professor da Faculdade de Medicina da USP, e Quézia Bombonatto, psicopedagoga e presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia
Revista Crescer
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